Só agora, passado alguns dias, consegui vir escrever sobre este pesadelo que eu e minha família vivemos nos últimos dias. Ainda estou muito abalada, mas mais forte, e hoje vim abrir meu coração e contar o que aconteceu com meu Bob. Vou contar porque muitas outras pessoas estão passando por isso neste momento, porque é algo que infelizmente pode acontecer com qualquer um (sim, você não está livre disso!), porque senti na pele esse desespero, e talvez meu relato possa ajudar alguém.
Antes de mais nada, preciso contar a história do Bob, ele foi um cachorro de rua, resgatado e doado em uma feirinha, para um homem muito mau. Ele apanhava, ficava na rua e sem comida, quando estava no quintal estava preso em uma corrente, e quando não estava preso, estava na rua. Bob foi resgatado pela minha mãe, estava com cicatrizes físicas e emocionais, não confiava em ninguém. Ele fugia sempre que podia, e como minha mora numa avenida bastante movimentada ele corria entre os carros, matando minha mãe de susto. Após alguns dias (e várias fugas) na casa da minha mãe, trouxe ele para casa. Os primeiros meses foram difíceis, Bob não confiava nem mesmo em nós, tentava fugir, não ficava muito perto, colo nem pensar. Só confiava na Cindy e ficava pertinho dela (ele sempre interagiu muito bem com outros cães).
Com muito amor e muita paciência fomos conquistando a confiança dele, em alguns meses já era o bebezinho da casa, grudadinho na gente, mas ainda com muito medo de outras pessoas. Foram anos de treino, contratamos uma excelente adestradora para nos ajudar por um tempo, estudamos sobre comportamento e bem estar animal, e seguimos todos os passos para fazê-lo sentir-se bem com as pessoas.
Única vez que fugiu de nós, logo nos primeiros meses após sua adoção (ele se assustou enquanto estávamos no salão de festas do condomínio) ele ficou em torno de uns 20 minutos longe, e foi encontrado na porta de casa, esperando por nós.
Todo trabalho e cuidado deu ótimos resultados, ele melhorou uns 90%, passou a interagir até mesmo com pessoas desconhecidas, viajamos muito e para vários lugares (a lazer e a trabalho), e o Bob virou nosso guia de trilhas da Cãomigo.
Pois é, depois de tantos anos e tantos cuidados não achava que isso poderia acontecer comigo, mas ninguém está imune, infelizmente.
No dia 19 de dezembro estávamos retornando de uma viagem de trabalho, eu, Bob, Cindy, minha amiga Bernadete e seu dog Menino, paramos no Rancho da Pamonha para comer e ir ao banheiro. Quando minha amiga Bernadete foi ao banheiro o cachorro dela, o Menino, se soltou para ir atrás dela, eu me levantei para segurá-lo e neste momento a guia do Bob se soltou da minha mão e caiu no chão, um homem que estava perto tentou ajudar segurando o Bob, neste momento ele se assustou com a reação do homem e correu. Ele atravessou a Rodovia Presidente Dutra (sim, a Dutra, as duas vidas da Dutra) e entrou no mato. No mesmo instante o segui, mas outras pessoas também o seguiram, fazendo com que ele corresse ainda mais e fosse mais longe. Foi neste instante que meu pesadelo começou.
O pessoal do Rancho da Pamonha foi incrível, e mesmo sem nenhuma obrigação nos ajudaram muito. Procuraram por horas, nos deram apoio total. Gratidão demais pelo apoio!
Foram dias de total desespero, e um sentimento que nem consigo explicar. Resumindo: foram 8 dias de busca incessante, mais de 15/16 horas na rua todos os dias procurando por ele, mais de 700 cartazes, 5000 panfletos, busca com drone, carro de som, anúncios pagos no Facebook e Instagram, Jornal on line e impresso da região, inúmeros grupos de Facebook de WhatsApp, até no programa Balanço Geral da TV Record ele pareceu. Claro que tudo isso só foi possível graças a toda ajuda que tivemos de pessoas mais que especiais. Obrigada!!!
Durante nossa busca tivemos experiências muito ruins com os seres humanos, pessoas debochando da situação, criticando sem nem ao menos nos conhecer, julgamentos de quem nem sabia o que tinha acontecido, ligação de bandidos dizendo que estavam com ele numa "boca", gente tentando tirar proveito da situação para nos extorquir, até foto de um pinto recebemos (pinto humano mesmo, pasmem!!), e muitas pessoas que simplesmente faziam pouco caso. Foi bem triste lidar com isso, doeu muito.
Mas felizmente, para cada idiota e mau caráter que cruzava nosso caminho, haviam várias pessoas do bem nos ajudando, nos defendendo, nos apoiando. A cada comentário maldoso, vários compartilhamentos de ajuda, para cada julgamento, muito apoio de outras pessoas. Confesso que me decepcionei com a falta de ajuda de pessoas que eu acreditavam que estariam do meu lado num momento tão difícil, com a falta de empatia e de apoio de pessoas muito, muito próximas. Mas também me surpreendi com tanto amor, carinho e ajuda recebi de outras pessoas. Pessoas muito próximas e queridas que eu sabia que podia contar (e agora tenho ainda mais certeza), e pessoas que eu conheço pouco, ou nem conheço, e que fizeram tanto por nós. As coisas boas, felizmente, superam a decepção.
Gente é sério, é muito emocionante ver o carinho que recebemos, a corrente do bem que se formou em torno do Bob me comove muito, e sei que foi fundamental para ele estar em casa de novo. Pessoas que nem conhecemos nos ajudando, nos dando água e comida, andando comigo pelas ruas pra não me deixar sozinha a noite, entrando no mato pra procurar por ele. Pessoas chorando, parando suas vidas, seus afazeres, suas comemorações, para ajudar a divulgar a nossa busca, fazer contatos, buscar alternativas. Amigos se deslocando de outra cidade e andando por horas para procurar por ele, oferecendo apoio, chorando e sofrendo com a gente. Gente que nem nos conhece fazendo promessas para encontrarmos ele. Pessoas nos acalmando, se comunicando com ele para acalmá-lo, fazendo meditações, todo tipo de ajuda. Foram tantas pessoas especiais! Agradeço a Deus todos os dias por ter colocado essas pessoas na minha vida!
Encontramos o Bob no dia 27 pela manhã, no bairro onde ele se perdeu, e onde focamos a nossa busca. Um senhor o viu nos fundos da sua casa, que é uma mata, e nos ligou. Fomos correndo pra lá, entramos na mata e chamamos por ele, até que ele nos ouviu e veio até nós. Um dos momentos mais felizes da minha vida!!! Alívio, alegria, gratidão, nem sei explicar com palavras o que senti.
Bob estava ainda com a coleira peitoral e guia, ninguém havia se aproximado dele, ele fugia das pessoas e se manteve sozinho por 8 dias.
Antes que digam para usarmos plaquinha, coleira, etc, já respondo: ele usa. Ele não estava com a plaquinha que havia caído no carro, mas estava de peitoral e guia, e para um cachorro como ele a plaquinha ajudaria muito pouco, pois é preciso se aproximar dele para ler, e ele não permitia aproximações. Vejam bem, não estou dizendo que a plaquinha não é importante, é sim, é muito importante, todos devem usar. Só estou dizendo que no caso dele não é suficiente. Mas sim, ele sempre usa.
E não, não foi sorte.
Localizar o Bob só foi possível através de muito trabalho, muito mesmo, trabalho planejado e árduo. Nessa nossa busca tivemos o privilégio de conversar com o Jorge, maior especialista na busca de cães do Brasil (acho que do exterior também), que foi fundamental para nosso final feliz. Jorge mesmo não podendo nos atender como contratado (ele tem uma demanda enorme e fila de espera),nos ajudou de muitas formas. Nos ajudou orientando de forma estratégica e prática, e principalmente nos fazendo entender que estávamos no caminho certo. Nos apoiou como um verdadeiro amigo, mesmo sem nos conhecer. Além de excelente profissional, é uma pessoa maravilhosa, com um coração enorme. Graças a ele conseguimos manter a sanidade e não surtar de vez.
Foi um experiência terrível, intensa, dolorosa, mas que como todas as experiências nos ensina muito. Aprendemos, e continuamos aprendendo muito. Aprendi a pedir ajuda (quem me conhece sabe que isso é difícil pra mim), aprendi a confiar mais nas pessoas, aprendi sobre solidariedade, sobre empatia, sobre amizade. Aprendi que o ser humano pode nos decepcionar, mas que cada um oferece aquilo que tem, cabe a mim baixar expectativas, esperar menos e fazer sempre meu melhor, para todos a minha volta. Espero sair deste pesadelo melhor do que entrei.
Infelizmente isso pode acontecer com qualquer pessoa, ninguém está imune a isso, por favor, vamos tentar ser mais gentis com as pessoas, vamos tentar ajudar mais e julgar menos, vamos dar amor e apoio, a última coisa que alguém precisa quando está sofrendo, são críticas e julgamentos.
Infelizmente muitas pessoas acabam desistindo de procurar após alguns dias, por não ter apoio, por não ter esperança, por não ter condições físicas, emocionais e financeiras, e muitos animais acabam ficando pelas ruas. Se estiver passando por isso, não desista! A média de tempo para encontrar um animal perdido é de uma semana a 10 dias, mas pode levar muito mais, alguns animais são encontrados após semanas, e até meses. Planeje, programe, e continue procurando, não desista!
Infelizmente nem todo mundo recebe a ajuda e o apoio que eu recebi, e muitas pessoas desistem de procurar depois de alguns dias, ou não sabem como fazer e acabam não tendo sucesso. Um dos principais problemas de quem perde um animal é a falta de amparo emocional, a falta de apoio e de suporte para lidar com o momento. Achei que era só comigo, mas descobri que é assim com a maioria das pessoas, infelizmente. Que tal tentarmos fazer diferente? Que tal tentarmos apoiar mais?
Ainda estou refletindo e processando muita coisa, fica aqui meu desabafo, mas principalmente meu agradecimento a todo amor, carinho e apoio que recebi. Com certeza foram decisivos para ter o Bob de volta. Muito obrigada!
Sobre o Bob, ele está se recuperando, está fora de risco e melhorando um pouquinho a cada dia, já está andando, e em alguns dias estará 100%.
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